sábado, 12 de julho de 2008

segunda semana

A segunda semana foi de fato o meu Debut, e como era de se esperar, não saiu muito como eu planejei. Eu tinha pensado no primeiro dia somente acompanhar com a escaleta uma educadora contando uma historia, e depois tentar chamar atenção para o que eu havia tocado. Eu esperava que elas reconhecessem certas relações que geralmente se estabelecem entre um determinado som e uma idéia extra musical associada, como por exemplo: uma escala descendente, como algo que desce, e uma escala musical ascendente, como algo que está subindo. Me parece que não necessariamente as crianças sentem dessa forma, e talvez não seja necessario que elas sintam dessa forma. Talvez seja um erro meu querer construir uma relação entre as crianças e a música a partir do uso de "metáforas musicais", ou seja, som grave é o som do elefante, som agudo, do passarinho, som desse jeito é o trovão... visto que os sons da escaleta são aqueles sons da escaleta e não "outra coisa". Me parece que como adulto sempre me sinto ansioso para que as crianças "nomeiem" os sons, a minha sensação de que eles estão aprendendo está ligada à capacidade que eles mostram que estão se relacionando racionalmente com a música. Mas me pergunto... como será que eles ouvem a música dentro deles, quando não há essa intermediação? Esse "como" não dá pra colocar em palavras, da mesma forma que, no fundo, não dá pra colocar em palavras "o que um som quer dizer".
Eu realmente vou ter que parar e pensar no que fazer para a próxima semana. De todo modo vejo que atenção deles é breve.
Consegui um êxito maior quando desisti de propor um "modelo de apreciação" (no qual as crianças teriam de relacionar um som com uma estrutura específica), apresentando apenas o instrumento como se fosse uma pessoa, ou entidade.

A partir dessa "presença mágica", consegui uma atenção das crianças para criar jogos do tipo, som, silêncio, e variações de dinâmica (volume alto, volume baixo). Mais eficaz do que moldar uma apreciação é buscar modos de diálogo no qual as regras não exijam uma redução da abstração da musicalidade. Acho que fica estabelecida a "presença mágica" a partir do momento em que o instrumento mostra sua língua mais musical do que a nossa, verbal, e deixa de funcionar como código de comando.

Coloquei em prática o diálogo das crianças com ela, a minha ilustre e exigente convidada - a escaleta - (que eu apresentava às crianças como uma amiga minha que estava presa em sua caixa, e que tinha medo de crianças pois dizia que elas faziam muito barulho, o que me deixava propor às crianças fazer o "jogo do silêncio" para encorajar a minha amiguinha a sair da caixa e tocar algo). Consegui o envolvimento momentaneo absoluto, muito especial, de todas as crianças. Mas, quanto melhor o truque, menos ele dura.

Um problema surge quando um climax dá vasão à ansiedade criativa das crianças, que finalmente ultrapassam a linha misteriosa que os separou até então, e passam a querer brincar com o instrumento, e a disputar a minha atenção, e finalmente dispersarem toda aquela vontade de música que é também vontade de brincar, uma e outra, se misturando como deve ser, mas sem ter ainda como tomar forma, pois brincar de música exige um treinamento de escuta muito grande, e quando se fica afoito por música, por brincar, geralmente não se escuta muito...
O desafio é regular a "temperatura" provocando sempre um efeito de reconstrução daquele mistério inicial. Intercalar atividades sem instrumento pode ser também uma boa idéia para que eles não fiquem tão agitados a partir do momento em que se vejam na possibilidade de tocar.

As crianças do primeiro estágio me pareceram bem distantes do desempenho das crianças do 2º e 3º estágios. Nas do primeiro, tudo me pareceu muito "interno", me deu até uma sensação de ser totalmente extrangeiro ao mundo delas, e de não ter nenhum tipo de passaporte, como me sinto às vezes com bebês, com os quais eu ainda não consigo conversar muito bem. Nas do segundo e terceiro estágio, já sinto uma facilidade maior delas em absorver propostas de jogos, com regras etc, senti aliás, que meu passaporte com elas (e talvez com as mais novas também) é o jogo. Só me sinto entre elas quando consigo imergir com elas num jogo, ou relação mágica, de expectativa, novidade... é muito difícil manter isso. Devo criar jogos que envolvam um "despertar da escuta", e quem sabe, eu possa, na medida do possível, fazer com que a escuta em si, ofereça suas próprias regras. Quem sabe um dia...

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